quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Decifra-me ou Devoro-te parte 1

  ”Merda!” - Sem sucesso, ela tentou gritar baixinho pela unha quebrada enquanto saia do quarto. O papel de parede todo estampado começou a lher dar agonia. Parecia que toda aquela informação a estavam sufucando: eram muitos quadros, vasos, esculturas e aquele maldito papel de parede. Quando viu a porta, que dava direto para as escadas do prédio, uma ansiedade tomou-lhe o corpo. Não era a primeira, nem a segunda vez que acordava na casa de um desconhecido sem se lembrar, ao menos, de como foi parar la. Antes de abrir a porta e acabar com toda tortura, ela se olhou no espelho. Ajeitou seu cabelo castanho escuro, que caia em perfeitas ondas sobre o peito, limpou o lápis borrado, que realçava ainda mais a cor azul claro dos seus olhos, e abriu a porta. Desceu o lance de escadas correndo, pegou o primeiro taxi e foi direto para casa.
   Enquanto a água ia delicadamente contornando seu corpo, lavando sua alma, ela tentou se lembrar da noite passada… Ela estava sozinha quando chegou lá. Sentou no bar figindo esperar alguém. Olhou o relógio dourado repetidamente. Pediu um “sex on the beach” para o garçom, rezando para que ele não perguntasse sua idade. Até fingiu cumprimentar alguém de longe mas, com seu tubinho preto que deixava à mostra cada curva do seu corpo, seus cabelos sedosos de propaganda de shampoo, seu rosto angelical e seus belos olhos mistériosos, ela não ficaria sozinha por muito tempo e sabia disso. Enquanto brincava com a laranja do seu copo, sentiu que alguém sentara ao seu lado. Ele era alto, tinha o maxilar quadrado, cabelos pretos e perfeitamente penteados, olhos cor de mel e pele cor de leite. Chegou perguntando as horas. Ela sorriu e fingiu não ter reparado no rolex que ele carregava no braço. Vendo ela sorrir ele perdeu todo o chão. Vendo ele sorrir ela sabia que a noite valeria a pena. Ela dissera que amava Beatles. Ele afirmava que Rolling Stone era muito melhor. Ela fechara a cara com tamanha ofensa e ele pedira desculpa pedindo o garçon mais um copo de whisky. Depois disso só vinha à lembrança ter acordado nua, com uma enorme dor de cabeça, sufocada com a decoração… Ela secou os cabelos, pegou a primeira calça jeans desgastada do armário, vestiu a camisa polo cinza que estava em cima da cama e calçou seu all star azul claro. Olhou pro relógio e viu que estava atrasada. Segurou firme o pingente em forma de coroa que levava no pescoço e desejou que esse dia passasse logo.
  Saiu correndo do carro e acabou esquecendo o celular lá dentro. Chegou ofegante no portão do colégio e por pouco não ficou pra fora. “Pelo menos não cheguei atrasada.” Pensou ela com a falsa esperança de que o dia poderia não ser tão ruim assim. Ela sabia que as pessoas, depois daquelas histórias, iriam olha-la de um jeito estranho, incriminador. Ela só não esperava que fosse tão terrível assim. Cada passo que ela dava era motivo para alguém cochichar, fazer cara de espanto, fuzila-la com o olhar. “Pelo visto meu dia vai ser ótimo!” disse ela revirando os olhos. Quando estava perto da porta da sala ela a viu. Fernanda estava encostada na parede, conversando com suas seguidoras fiéis. As duas eram, até pouco tempo atrás, grandes amigas. Elas contavam tudo uma para outra. Até que um dia Fernanda, que não aguentava mais viver à sombra da amiga que tinha tudo: dinheiro, roupas caras, os caras mais gatos, o cabelo perfeito, o corpo perfeito, a vida perfeita… resolveu contar para todo o colégio todos os podres da melhor amiga. Desde os porres às noitadas na casa de estranhos. “Isso não vai mudar a sua vida.” Disse ela à Fernanda no dia da briga. E ela tinha razão. Fernanda ia continuar baixinha, com o cabelo crespo e com o nariz de batata. “Pelo menos vai mudar a sua e, quer saber? Isso já me deixa muito feliz.”. Depois desse dia ela saiu do colégio por vergonha de encarar todo mundo e só hoje tomara coragem e voltava. Agora lá estava ela, frente a frente com Fernanda. “O dia não tem como ficar pior!” E, virando bruscamente esbarrou em alguém, derrubando todas as folhas no chão. “Desculpa, desculpa! Eu sou muito desastrada! Desculpa!” Ela não sabia se catava as folhas no chão ou se desculpava. “Relaxa!” De repente, o corpo dela gelou completamente, o coração disparou e ela não conseguiu se mover. Ela reconhecera aquela voz. Voz que a atordoava de uma forma única. De uma forma que nenhuma outra iria jamais atordoar..

2 comentários:

  1. Oi Linda! Nossa que amei teus textos, aquele com o titulo “Porque eu sou assim?” você realmente fala sobre você? Gostei se eu conseguir achar onde te seguir já estarei seguindo Beijos

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